25º Domingo do Tempo Comum — Ano C
Os pobres são os assessores do Rei Eterno
“Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas”. (Lc 16,9)
Pe. Adroaldo Palaoro, SJ
A parábola do evangelho deste domingo não pretende se referir em absoluto à corrupção e ao roubo, mas ela está centrada numa questão radical: “Os filhos das trevas são mais astutos que os filhos da luz”.
Jesus, na parábola, não louva o mal administrador por sua péssima administração e roubos. O que Jesus quer destacar é sua “inteligência” e “esperteza” para garantir seu futuro, a astúcia com que atua para atrair a benevolência dos credores de seu amo.
Não devemos imitá-lo na sua injustiça, mas na sua previdência. O administrador infiel é um filho deste mundo; deixa-se guiar pelo cuidado de sua existência terrena. Com esperteza, com decisão e sem escrúpulos, aproveita o que lhe pode proporcionar vantagem para garantir sua vida futura.
E é aqui onde encontramos a chave de compreensão do relato: como “filhos da luz” precisamos agir de um modo inteligente e com esperteza, utilizando todos os recursos em favor da vida.
Jesus reconhece a astúcia dos “filhos deste mundo” utilizada para cometer delitos, enganar, roubar ou levar uma vida corrupta; para aqueles que o seguem, Jesus revela a necessidade de serem astutos para fazer o bem e lutar pela justiça; quer que os “filhos da luz” sejam astutos positivamente: estejam atentos, sejam hábeis e permaneçam despertos diante dos mecanismos do mal e usem da criatividade para o bem do Reino.
O administrador astuto, quando foi denunciado por desvios dos bens do patrão, agiu pensando exclusivamente nele, procurando abrir para si um caminho no futuro imediato, para continuar fazer o que sempre fazia: roubar.
Quando o dinheiro se converte no “deus” a quem adorar, o ser humano se deprecia: direitos humanos em liquidação, a educação, a saúde, a moradia…, tudo é deixado de lado.
O dinheiro, como meio, tem sua importância, mas é preciso estar atento aos sinais de alerta antes de atravessar essa sutil fronteira que leva à ambição, à cobiça e à avareza, até transformar a pessoa num ser que já não sabe valorizar o que acontece por dentro, sente-se diferente e distante do resto da humanidade.
Em cada um de nós convivem a luz e as trevas. A parábola deste domingo parece conter uma profunda ironia, ao confrontar-nos conosco mesmo e perguntar-nos de que maneira procedemos nos assuntos que concernem às “trevas” (ego) e naqueles que potencializam a luz que somos.
A experiência nos diz que quando é nosso ego que toma iniciativa, ele ativa meios, recursos, táticas, estratagemas…, com a finalidade de sobressair vaidoso e assegurar sua sobrevivência (como faz o empregado da parábola, que representa, justamente, o nosso próprio ego e seu mundo de interesses).
O que ocorre com a luz, que é a nossa verdadeira identidade? Que fazemos com o melhor de nós mesmos? Se investíssemos tanta motivação e tantos meios para que nossa verdadeira identidade se manifestasse e deixasse sua marca, nosso mundo seria bem diferente.
A parábola e as sentenças de Jesus trazem à tona a questão da riqueza no caminho espiritual, com um destaque fundamental: diante do risco de absolutizá-la (endeusá-la), requer-se lucidez (astúcia) para usá-la como instrumento a serviço da vida.
“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”. Estas palavras de Jesus não podem ser esquecidas nestes momentos por nós que nos sentimos seus seguidores, pois contém a advertência mais grave que Jesus deixou à sua comunidade. O dinheiro, convertido em ídolo absoluto, é o grande inimigo que impede a construção de um mundo mais justo e fraterno, querido por Deus.
Infelizmente, a riqueza se converteu, no nosso mundo globalizado, em um ídolo de imenso poder que, para sobreviver, exige cada vez mais vítimas, desumaniza e empobrece cada vez mais a história humana; assim nos encontramos enredados por uma crise gerada, em grande parte, pela ânsia de acumular.
Praticamente tudo se organiza, se move e se dinamiza a partir dessa lógica: buscar mais produtividade, mais consumo, mais bem-estar, mais prestígio, mais poder sobre os outros… Esta lógica é destruidora; se não a estancarmos, pode colocar em perigo o ser humano e destruir a Casa comum.
Jesus nos alerta que, a primeira coisa a fazer, é tomar consciência daquilo que está acontecendo. Esta não é só uma crise econômica. O apego aos “bens” apresenta-se como uma das tentações mais poderosas para todo seguidor de Jesus. A busca da própria segurança é a base da tentação pelo dinheiro.
De fato, nossa relação com o dinheiro nunca é mera e exclusivamente funcional, econômica, monetária, de valor de troca. Sempre há um “algo mais” em nossa vinculação com ele.
Provavelmente, poucas relações com o mundo material de objetos estão tão “carregadas” afetivamente como esta do dinheiro. A atração, o apego, a dificuldade para desprender-nos dele… e, muitas vezes, uma forte ambivalência, ou seja, uma polaridade de sentimentos e afetos contrários em relação com esse objeto que progressivamente vai se fazendo tão determinante em nossa existência. Compreender as vinculações íntimas que todos mantemos na relação com o dinheiro nos ajudará a compreender, sem dúvida, a lógica perversa que pode ser desencadeada na relação conosco, com o outro e com a criação.
Nos relatos do Evangelho, o “dinheiro” é designado com o termo “mamón”, que só aparece quatro vezes no Novo Testamento e sempre na boca de Jesus. Trata-se de um termo que provém da raiz aramaica “aman” e significa qualquer riqueza sobre a qual o indivíduo apoia sua existência.
Além de uma evidente e fundamental função de valor de troca que possui, são múltiplas e variadas as significações que o dinheiro pode chegar a desempenhar para cada um: meio com o qual ganhar afeto, um suporte de prestígio e segurança pessoal ou um instrumento poderosíssimo de poder sobre os demais, um meio de defesa e inclusive de ataque sobre os outros, um acréscimo de valia pessoal, tendências perversas de exibição e ostentação frente os outros, corrupção…
“Usai o dinheiro injusto para fazer amigos”: é um apelo a investir tudo o que temos a serviço daquilo que vale verdadeiramente: nosso verdadeiro ser, alimentar comunhão com os outros, viver a partilha…
Utilizamos com sabedoria o “dinheiro injusto”, quando compartilhamos com aquele que passa necessidade.
Nunca poderemos atuar como donos absolutos daquilo que possuímos. Somos simples administradores. A única coisa que se conserva é a que é partilhada. O que não se partilha, se perde.
No fundo, Jesus nos quer dizer assim: “Empregai vossa riqueza injusta para ajudar os pobres; ganhai sua amizade compartilhando com eles vossos bens. Eles serão vossos amigos e, quando na hora da morte o dinheiro já não sirva para mais nada, eles os acolherão na casa do Pai”.
Dito com outras palavras: a melhor forma de “lavar” o dinheiro injusto diante de Deus é dividi-lo com seus filhos mais pobres.
Texto bíblico: Lc 16,1-13
Na oração: Traço característico, que define a qualidade de vida de uma pessoa que segue Jesus Cristo, é a simplicidade de vida, entendida no sentido de um nível econômico simples e despojado.
— Como testemunhar que se pode ser feliz vivendo uma cultura da gratuidade, da moderação, da solidariedade, possibilitando uma partilha dos bens de maneira mais igualitária e justa para todos os seres humanos e que favoreça melhores condições de realização humana?
— A quem sirvo? Quem é o “senhor” que comanda o meu coração?
— Deus pôs em minhas mãos tantos dons, tantas possibilidades… E que estou eu fazendo com tanta “riqueza” que o Senhor me confiou? Sou um(a) administrador(a) fiel e solícito(a), ou vou desperdiçando pela vida os “bens” (talentos e oportunidades) que o Senhor me deu e continua me cumulando?
Ilustração: IAS Agência (Liturgia Diária da Paulus, setembro’2025 – p.80)